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Iceberg à vista nas agências digitais

Atualizado: 6 de nov. de 2022


A notícia pode não ser boa para a maioria dos entusiastas defensores do crescente mercado de publicidade digital. As agências digitais estão com dificuldades em continuar sendo competitivas no cenário atual.

Não se trata de falta de competência ou falta de esforço dos desbravadores digitais. O problema está no modelo atual que é adotado pelo mercado de provedores de serviços digitais no Brasil.


A grande verdade é que as agências digitais são novas se comparadas ao mercado publicitário. Elas se estabeleceram em um mercado recente e não tendo um modelo próprio de negócio, começaram a sofrer uma grande influência das agências tradicionais, que se apoiam ainda fortemente nas receitas advindas de mídias, com seus comissionamentos e bonificações por volume.


Nas agências tradicionais, o agenciamento de mídia é o responsável por pagar a conta dos demais serviços, bancando atividades como o Atendimento, Planejamento, Criação e até produção em alguns casos. Este modelo tradicional começou a ser adotado também nas agências digitais, atendendo uma solicitação dos seus clientes, já acostumados com o processo de contratação das agências off-line. A maioria dos clientes entendia que este modelo de remuneração baseado em comissionamento de mídia já era testado e o mais fácil de justificar internamente, pois a responsabilidade de controlar os esforços e entregas de forma a se ajustar no budget de mídia seria das agências, como sempre havia sido.


Mesmo as agências digitais que tentam oferecer outro modelo de remuneração, sofrem com o assédio das agências tradicionais aos seus clientes que muitas vezes oferecem o trabalho digital “sem custos”, só para manter a negociação atual baseada na remuneração de mídia. Isto é extremamente tentador para um cliente, pois não precisa mudar em nada seu processo de contratação e ainda “ganha de graça” os trabalhos digitais. Não vou entrar no mérito da qualidade dos trabalhos digitais que são entregues pelas agências mais tradicionais. Isto pode variar de agência para agência, e existem grupos tradicionais que conseguiram se adaptar rapidamente a esta nova realidade, mas não são todos. No entanto, é perfeitamente correto dizer que no nosso mercado não existem coisas “grátis”. De alguma forma se paga por aquilo que se recebe. Ou não se paga, mas também não se recebe. Um ponto que precisa ser refletido pelos clientes, mas que as vezes ingenuamente é aceito pelos clientes que tem metas de redução de custos.


O problema maior é que este formato de agenciamento de mídia não é sustentável para as agências digitais, por vários fatores:

  1. As agências digitais têm uma característica mais laboral do que as agências tradicionais, pois o bom trabalho em mídia digital ou mídia de performance pode ser comparado a um trabalho em uma bolsa de valores. O termo agência é um termo que pouco faz sentido para as chamadas agências digitais. Talvez devêssemos chama-las de Corretoras Digitais, devido ao dinamismo e responsabilidade pelo resultado que uma operação destas exige.

  2. Os volumes de investimento digital no Brasil ainda são muito menores que os valores investidos na mídia tradicional. Isto é fruto de uma falta de conhecimento dos clientes neste assunto, que ainda preferem investir mais em canais de massa do que em canais mais segmentados e personalizados, como os ambientes digitais. Este baixo volume de investimento atual inviabiliza a remuneração baseada em comissionamento de mídia. A conta não fecha.

  3. O trabalho nos meios digitais exige a construção ou desenvolvimento destes ambientes, diferentemente da maioria dos veículos off-line, o que torna o trabalho ainda mais específico e trabalhoso. Ainda se tem um trabalho taylor-made para atender cada particularidade do negócio digital em várias disciplinas. Esta multidisciplinaridade dificulta a contratação pela área de marketing tradicional dos clientes, que prefere as vezes manter o investimento apenas em mídias convencionais e sem risco de implementação e ainda não ter que envolver outras áreas da empresa, como TI por exemplo.

  4. Se na mídia tradicional normalmente não se tem o controle muito rígido sobre ROI (Sigla em inglês de Retorno sobre o Investimento), no mundo digital a mensuração de resultado é em tempo real, e isto exige cuidado e atenção, tanto da agência como do cliente. Esta é uma responsabilidade que nem todos querem ter.

  5. O comércio eletrônico desponta como uma das grandes apostas para o aumento de vendas. Na Europa e nos Estados Unidos o e-commerce representa uma parcela muito substancial dos negócios. No Brasil, este montante ainda tem muito a crescer. Apenas as agências especialistas neste assunto estão conseguindo dar resultados. As agências tradicionais, podem não estar ainda totalmente preparadas para atuarem com eficiência neste segmento, seja pela maior especialidade que se exige ou por não ter um modelo mais justo de remuneração, que neste caso seria o comissionamento por vendas no e-commerce, mas a maioria dos clientes não estão confortáveis com este modelo de remuneração. Ainda se apegam ao comissionamento de mídia, que não funciona para este tipo de atividade.

  6. O mundo digital é complexo e cheio de especificidades, como Search Engine Optimization, Plataformas de Business Intelligence, e-Commerce, Search Engine Marketing, Social Media, ambientes digitais complexos, com ambientes logados e controles de segurança. Uma agência digital deveria ser capaz de desenvolver todas estas especificidades, integra-las, gerenciando projetos com todas estas disciplinas, contando com uma equipe robusta e especialista, coisa que não se exige em uma agência tradicional que já conta com um modelo clássico e já testado ao longo de vários anos.A maioria dos pontos que menciono aqui não são novidades para o mercado, mas poucos estão dispostos a mudar este modelo, tanto por parte das agências como pelos clientes. Mas conseguimos ver alguns movimentos interessantes acontecendo. Já percebemos um acréscimo na contratação de empresas verticais, especialista em apenas uma disciplina, onde o modelo de contratação pode ser melhor trabalhado e combinado com aquela especialidade, como por exemplo e-commerce, Social Media, desenvolvimento de plataforma digital ou SEO.


Mas e o futuro das agências digitais full-service?

Estas vão precisar de reinventar. Primeiramente assumindo que seu modelo não é e nunca foi sustentável se for amparado unicamente no agenciamento de mídia. As agências precisarão caminhar para um modelo de corretagem digital, administrando ativos e valores de seus clientes neste ambiente, fazendo recomendações e operando as ferramentas para gerar os resultados. No momento que isto for entendido pelos clientes e estas empresas digitais, fatalmente o modelo de remuneração terá que ser alterado, buscando uma remuneração mais justa e focada nos resultados obtidos. Com este novo modelo, as empresas poderão ter nos seus fornecedores digitais novos parceiros comerciais, preocupados com seus resultados e uma nova linha de negócios digitais, proporcionando novas fontes de receita, e saindo deste modelo atual onde muitos buscam apenas um fornecedor para cuidar institucionalmente de sua presença na Internet. Esta mudança precisa acontecer nos clientes, mas precisa ser proposta por estas novas empresas digitais, ou o que estamos chamando de Corretoras Digitais.


Mesmo neste modelo de corretagem, as agências digitais atuais vão ter que remodelar suas estruturas e começar a pensar seriamente em dividir suas unidades de negócios, com foco especialista e com estratégias de comercialização distintas. Isto não significa que estas unidades não possam compor um Grupo, compartilhando custos de instalação, back office e atendendo full-service  as marcas que assim exigirem, mas cada unidade de negócio precisa contar com profissionais distintos na administração e com metas diferenciadas. Desta forma, cada empresa do grupo pode trabalhar melhor o seu modelo de remuneração e fechar acordos com os clientes, seja por success fee, comissionamento, fee por alocação de profissionais ou até agenciamento de mídia, mas dentro de realidade daquela disciplina técnica.


O mundo está mudando muito rapidamente e sinceramente acho que este tipo de mudança no mercado já demorou demais para acontecer no nosso mercado. Já ouvi muita gente falando deste caminho, mas poucos colocando em prática e bancando esta revolução. Os resultados financeiros da maioria das agências digitais estão mostrando que elas precisam de reformulação, mas ainda não se sentem confortáveis em como conduzir esta mudança, com receio que esta ruptura afete ainda mais a relação com seus clientes e prospects. Para ajudar, os próprios clientes ainda não estão preparados para esta mudança. Mas é um caminho sem volta e uma das poucas soluções disponíveis para as agências digitais brasileiras.

Mas não é só isto. Esta segregação de negócios tem que ser acompanhada do abandono de outras práticas vindas do modelo de publicidade off-line. O modelo de gestão precisa estar mais conectado ao modelo das empresas de tecnologia e de consultoria e muito menos na busca por exposição que temos na maioria das agências de publicidade. Precisamos diminuir os briefings e aumentar as especificações funcionais. Temos que trocar o clássico processo criativo pela metodologia ágil de gerenciamento de projetos. O glamour precisa ser maior na execução do que na criação e a busca por resultado precisa ser maior que a busca por prêmios.


Faço votos que este modelo mude logo, e o mercado encontre um formato que seja eficiente para os prestadores de serviços digitais e seus clientes. Se isto não acontecer logo, perderemos uma oportunidade de deixar o mercado mais sustentável e veremos uma quebradeira de empresas digitais, que hoje padecem em um modelo carente de uma reforma transformadora.


Muitos mercados mais maduros já estão com este processo de transformação em um estágio muito mais avançado. Resta agora aos nossos empresários tomarem a coragem necessária para fazer este movimento também aqui no Brasil, antes que seja tarde demais.

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